
Deputado federal reafirma que até vai o final na disputa ao Senado por se tratar de uma decisão partidária, além do exercício de cidadania
NOELMA OLIVEIRA
Da Reportagem
Nesta semana, o presidente estadual do PT, deputado federal Carlos Abicalil, foi o político mais comentado no cenário estadual não só por sair vitorioso na prévia para disputar o Senado, mas por derrotar no voto uma das figuras mais representativas do Partido dos Trabalhadores no Estado, a senadora Serys Slhessarenko.
Em meio às críticas do grupo liderado pela senadora e pelos mais diversos representantes de partidos políticos do Estado, Abicalil procura manter o discurso ponderado. Internamente, o dirigente acredita no diálogo para contornar o momento de crise, muito embora ele não cite em nenhuma declaração as palavras racha ou crise na sigla.
Apesar da celeuma instalada em Mato Grosso, Carlos Abicalil se mantém como um dos políticos mais próximos do presidente Lula, com quem almoçou esta semana, após vencer as prévias contra a senadora do seu partido.
Sindicalista, ex-presidente do Sintep e ex-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), Abicalil começou a consolidar sua carreira política nestes movimentos. Em 1998, numa decisão partidária, disputou o governo do Estado, ficando em terceiro lugar com 64.619 votos. Com um discurso propositivo e pragmático, provocou os adversários à época e, certamente, admiração, conquistando eleitores e militantes petistas.
Tanto, que saiu de uma derrota em 1998 para a conquista de uma cadeira na Câmara Federal em 2002 com 118.120 mil votos, o segundo mais votado de Mato Grosso. Em 2006 ampliou o número de eleitores para 128.851, o primeiro mais votado entre os oito representantes da bancada federal.
Diário de Cuiabá - O senhor acaba de sair vitorioso das prévias do PT para concorrer ao Senado. Porém, pelas declarações da senadora Serys Slhessarenko, a derrota dela implica em mais um problema de disputa interna na legenda. Como o senhor pretende contornar este problema?
Carlos Abicalil - A realização da prévia partidária é uma das questões estatutárias que se originaram da fundação do PT. A ditadura militar previa em legislação que qualquer cidadão portador de mandato partidário já chegava à convenção com aquele posto assegurado, como ponto de partida. Essa regra esteve em vigor na lei até muito recentemente. O PT nasceu rompendo com aquela tradição da chamada candidatura nata. Isso é parte do vigor partidário que atualiza e aperfeiçoa seus instrumentos de democracia interna, abre espaços a lideranças novas, rompe laços históricos de inspiração do antigo direito divino das monarquias e reduz o peso do patrimonialismo familiar que ainda ocupa largos espaços na política. O vitorioso na prévia partidária é o PT. Um partido organizado em 131 municípios de Mato Grosso que mobiliza nove mil militantes, antes das eleições gerais, movidos pelo debate de estratégia político-eleitoral, de programa de desenvolvimento sustentável, de formulação de uma tática de aliança com partidos maiores que o nosso, é detentor de um vigoroso processo de participação política. Não se pode esquecer de que o PT saiu das eleições diretas para suas direções em todos os níveis no final do mês de novembro, realizou o seminário estadual sobre programa de desenvolvimento humano e sustentável em dezembro, instalou os novos diretórios entre janeiro e março, realizou seu V Congresso Nacional quando aclamou (por unanimidade) Dilma pré-candidata à Presidência da República, fez seu encontro de tática eleitoral para Mato Grosso em 14 de março, quatro encontros setoriais temáticos no dia 28 de março, a prévia em 18 de abril, preparamos as inscrições para as candidaturas proporcionais e promovemos as jornadas da juventude e de formação e o encontro de mulheres, neste final de semana. Em 23 de maio, decidiremos sobre a lista de candidaturas e a conclusão das alianças. Nossa dinâmica, felizmente, é muito mais ampla do que nossas personalidades. A prévia faz parte deste rico processo que dá vigor, anima, mobiliza... Por essa razão, já são muitos os apoiadores e apoiadoras da pré-candidatura da Serys que vêm manifestando seu apoio incondicional à decisão partidária. Ainda na terça-feira recebi, pessoalmente, as saudações e o apoio de senadores petistas. Almocei com o presidente Lula na ocasião da visita do presidente do Líbano e todos estamos comprometidos com a unidade de ação e a busca da vitória do projeto nacional que representamos. O debate prosseguirá. A senadora conquistou uma representatividade que é um patrimônio do PT, reconhecido por mim em todas as ocasiões públicas ou internas. Seu último boletim eletrônico na véspera da prévia reproduzia isso. Prudência, humildade, tolerância e paciência são as recomendações que sigo, convicto de que nosso desafio maior ainda virá.
Diário - O PT ainda mantém o entendimento inicial de se aliar ao PR e ao PMDB de Mato Grosso?
Abicalil - O PT decidiu um leque de alianças na base comum entre o governo Lula e o governo Blairo/Silval. Dos 243 delegados estaduais, 227 votaram a mesma resolução que defendi durante as eleições internas para a direção partidária no ano passado. Com o PMDB e o PR, as conversas estão avançadas há mais de um ano. Tenho conversado semanalmente com o presidente do PSB, deputado Valtenir Pereira, expondo nossa proposição de um palanque unitário nacional e estadual. Esta pauta será tratada pela direção nacional do PSB no próximo dia 27. Estive com o presidente do PR, deputado Wellington, na terça feira. Com o governador Silval, na quarta. Sigo a mesma estratégia nacional, pois dela participo como representante na coordenação política da bancada petista na Câmara. Estamos organizando a reunião com o PCdoB para a próxima semana. Reiteramos nosso interesse de diálogo com o PDT e com o PP. Por enquanto, não há qualquer razão para alterar o rumo.
Diário - O que senhor achou da posição de Serys de apoiar a candidatura do empresário Mauro Mendes (PSB)?
Abicalil - O exercício de um direito de opinião para a atualização do debate partidário, ainda que sob o calor do resultado da prévia. Quem, entre nós, mais acompanhou as agendas institucionais do governo estadual nos últimos meses, com muita visibilidade pública, inclusive, foi a Serys. Toda a imprensa mato-grossense é testemunha disso. O diálogo vai prosseguir com maturidade.
Diário - O senhor acha que o seu mandato no Senado, se eleito, será melhor do que o atual mandato exercido pela senadora? Por que e em quais aspectos?
Abicalil - A avaliação de nossos mandatos é muito positiva e orgulha os eleitores do PT e de Mato Grosso. Eu não fiz uma disputa de avaliação de mandatos. Fiz uma proposição de projeto partidário olhando para frente. Para a campanha eleitoral de 2010, com seus desafios e perspectivas, com os cenários e o jogo político em torno deles. Ainda mais: olhamos para a construção de uma maioria política sólida e programática, para uma aliança partidária estável, para a governabilidade no próximo período, para a oportunidade de crescer nossa representação nos parlamentos estadual e nacional, nossa participação institucional no próximo governo. Cada mandato e cada legislatura são diferentes, assim como cada eleição. O juízo sobre eles só pode ser feito a posteriori, consideradas as conjunturas específicas que o constituíram. Além do mais, o Senado e a Câmara têm atribuições típicas de cada representação, além das atribuições comuns.
Diário - Existe alguma possibilidade de o senhor voltar atrás e não disputar o Senado?
Abicalil - A decisão partidária, nesta postulação, está tomada. Vou segui-la, por dever de ofício, por convicção política, por exercício de cidadania.
Diário - Como o senhor analisa a posição da senadora de mudar repentinamente, já que defendia até então a composição PT, PR e PMDB?
Abicalil - Creio que o meu comentário na pergunta anterior está claro!
Diário - O senhor tem mantido conversas com o presidente do PSB, deputado federal Valtenir Pereira, mesmo o deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) mantendo, até o momento, a sua disposição de disputar a Presidência da República. Não é uma contradição em relação à candidatura da Dilma Rousseff?
Abicalil - Não há qualquer contradição. As direções nacionais do PT e do PSB também seguem conversas sistemáticas. Nossa resolução do encontro estadual está em plena sintonia com a posição do V Congresso Nacional do PT. O PSB tem claro que há o limite para a aliança no primeiro turno. Faz parte do governo Lula, apoia a base estadual. O PDT também é base nacional. Já o PPS faz oposição sistemática e estará com a candidatura Serra. O PSB está refletindo de forma madura. Precisa do apoio do PT nos estados em que quer reeleger governadores e onde tem fortes perspectivas, sem rupturas. Tenho convicção de que pensa também em ampliar suas bancadas parlamentares nas assembleias, na Câmara e no Senado. Conversar muito antes da decisão nunca é demais.
Diário - As disputas internas no PT sempre foram consideradas normais dentro da trajetória democrática do partido. Mas o senhor não acha que os embates do seu grupo com o da senadora Serys geram não só dissabores como prejuízos à sigla? Será que as divergências já não estão extrapolando os limites do razoável?
Abicalil - Da minha parte, não! Vocês acompanham com muita atenção os processos internos do PT. Às vezes fazem torcida explícita. Essa é uma forma de fazer a chamada opinião pública participar. Se vocês fizerem um balanço comparativo das matérias, notas e artigos que o próprio Diário publicou, as fontes que buscou, quem e a que regeu, os períodos, as fotografias, a organização gráfica, fazem parte de uma leitura da disputa. Trabalharei até o fim do mandato de presidente estadual para assegurar duas características fundantes do PT: a liberdade de pensamento, organização interna e expressão, e a unidade de ação pautada na decisão das instâncias partidárias. Essa é a diretriz que me move. O PT tem um estatuto com o qual todo filiado se compromete integralmente. Recentemente, aprovamos um Código de Ética. É um partido que se relaciona muito com os "simpatizantes", o que não é comum nas outras organizações. Talvez, por ser o mais vigiado, o mais transparente, o mais público, seja o mais querido também, como revelam as sucessivas pesquisas de opinião.
Diário - O governador Silval Barbosa (PMDB) se mostrou apreensivo com a posição da senadora de defender uma aliança com o PSB de Mauro Mendes. Neste momento, o que senhor, enquanto presidente da sigla no Estado, pode assegurar ao governador, que dava como certo o apoio do PT à sua candidatura à reeleição?
Abicalil - Estive com o governador, como já mencionei. Há serenidade no processo que estamos construindo. Também o governador tem interesse num palanque unitário no Estado e reconhece, como eu, que é preciso respeitar a autonomia de cada partido, com sua trajetória e tempo próprios, com interesses pontuais legítimos e com identidades diversas. Não há qualquer eleição sem riscos. Muitas são as histórias de mudanças de posição na última hora da convenção. Tenho trabalhado para que não haja qualquer surpresa e conduzi a decisão interna assegurando essa liberdade e essa autonomia.
Diário - Não existe possibilidade de o PT surgir ainda na eleição deste ano com candidatura própria?
Abicalil - O cenário desenhado até agora não aponta para esta hipótese. A decisão do encontro de março deixou clara essa avaliação.
Diário - Qual a lição que o senhor tira desta disputa?
Abicalil – O PT é um partido vivo, atuante, participativo, que não teme o debate interno, que disputa posições, que atualiza sua leitura da conjuntura, que possui grandes quadros e quadros com ascendência, que está organizado com capilaridade em todas as regiões do Estado, que se interessa e interessa à sociedade, aos veículos de comunicação, aos movimentos sociais, às lideranças comunitárias, aos outros partidos políticos. Também é motivo da cobiça de poderosos agentes externos. Por isso mesmo, é objeto de observação e de crítica constantes. Esse quadro nos ajuda a ter firmeza de propósito, clareza no argumento, cuidado com a palavra e com a ação, carinho pela organização interna e coragem para o debate público.
Diário - O que o angustia neste momento com as críticas desferidas pela senadora e seus aliados contra o senhor? Como por exemplo: as insinuações sobre sua relação com o aloprado Valdebran Padilha.
Abicalil - Não sofro de angústia, felizmente. Sou um homem de fé, zelo muito pelo compromisso e pela responsabilidade que assumi, sei que a quem mais é dado mais é cobrado, procuro exercer a autocrítica permanentemente, dou atenção aos pensamentos e opiniões diferentes das minhas, sei distinguir as explicitações críticas de conteúdo daquelas que são de oportunidade política e eleitoral. As apreensões fazem parte da vida privada, as atribulações acompanham a vida pública. Não respondo a qualquer insinuação com leviandade, nem troco suspeição por suspeição. Essa tática não constroi coisa alguma. Quem comete erros deve se submeter às reparações consequentes. As ferramentas do poder público e da própria sociedade para exercitar a transparência e a lisura estão cada vez mais eficazes e isso é um bem para todos nós. Confio nas ações de fiscalização e de controle, embora saiba que muitas versões publicadas podem atender, também, a outros interesses.
Nenhum comentário:
Postar um comentário